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Provavelmente azul
Táxi azul é visto em acidente
Nota aos Profissionais da Educação: Este texto é um excelente recurso didático para a abordagem prática de probabilidade e estatística bayesiana.
- Time editorial
Tempo de leitura: 10 minutos
Imagine o seguinte cenário, extraído do livro “Rápido e Devagar” do Prêmio Nobel Daniel Kahneman:
“Um táxi se envolveu em um acidente de atropelamento e fuga à noite.
Duas companhias de táxi, a Verde e a Azul, operam na cidade. Você recebe os seguintes dados:
- 85% dos táxis na cidade são Verdes e 15% são Azuis.
- Uma testemunha identificou o táxi como Azul. O tribunal testou a confiabilidade da testemunha nas circunstâncias que existiam na noite do acidente e concluiu que a testemunha identificou corretamente cada uma das duas cores 80% das vezes e falhou 20% das vezes.
Qual é a probabilidade de que o táxi envolvido no acidente fosse Azul em vez de Verde?”
Antes de continuar a leitura, pause por um momento, siga sua intuição, pense e anote a sua resposta.
O texto fornece duas informações importantes: a proporção dos táxis e o depoimento (sujeito a erro) de uma testemunha.
A proporção dos táxis é chamada de taxa base e significa que, se não houvesse qualquer outra informação, esse seria o número que nos basearíamos para estimar a probabilidade de um acidente envolvendo um táxi Azul.
No entanto, a identificação da testemunha muda esse cenário, e a probabilidade deve ser ajustada de acordo.
Você ainda tem a sua resposta anotada?
Spoiler: a resposta para o problema é 41%. Mas é interessante notar que, quando um problema desse tipo é colocado em prática, as pessoas desconsideram a taxa basal e confiam apenas na testemunha, dizendo que a probabilidade de o táxi Azul estar envolvido é 80%.
Vamos ver como chegar na resposta correta.
Primeiro estabelecemos dois eventos:
A: representa o evento de o táxi ser Azul.
B: representa o evento de a testemunha dizer que o táxi é Azul.
Se você leu a edição #22, vai se lembrar que discutimos eventos independentes, aqueles onde o resultado de um não altera o resultado do outro.
Mas esse não é o caso dos eventos acima: se uma testemunha identifica um táxi como Azul, a probabilidade de o táxi ser Azul não é mais 15%, mas deve ser maior para refletir essa evidência.
Nesse caso, usamos a seguinte notação: P(A|B), que é chamada de probabilidade condicional, já que indica a probabilidade de A ocorrer sob a condição de que B já ocorreu. Ou seja, a probabilidade de o táxi ser azul (A) dado que a testemunha diz que o táxi é azul (B).
Para dois eventos independentes E1 e E2 a probabilidade de E1 ocorrer dado que E2 ocorreu continua sendo a probabilidade E1, ou seja, P(E1|E2)=E1.
Na edição #22, também falamos de eventos mutuamente exclusivos, que são eventos que não podem ocorrer simultaneamente, ou seja, a probabilidade de dois eventos E1 e E2 ocorrerem simultaneamente é nula, ou seja, P(E1∩E2)=0.
Mais uma vez esse não é o caso com os eventos A e B, visto que uma testemunha pode identificar um táxi como Azul, e o táxi pode simultaneamente ser Azul.
Mas como podemos resolver o problema proposto? Utilizando um teorema da matemática chamado de Teorema de Bayes que nos permite atualizar probabilidades à medida que obtemos novas evidências.
A formulação matemática do teorema é a seguinte:
No nosso caso, P(A) é a probabilidade de o táxi ser azul quando não temos nenhuma evidência, ou seja, a taxa base de 15%; P(B|A) é a probabilidade de a testemunha identificar o táxi como azul, dado que o táxi é azul, o que no nosso caso é 80%, como apresentado no enunciado. Por último, a probabilidade P(B) no denominador é a de a testemunha identificar o táxi como azul.
Note que o teorema introduz um fator de ajustamento para considerar as novas evidências. Se os eventos A e B fossem independentes o fato de A ocorrer não influenciaria B e a probabilidade condicional P(B|A) seria igual a P(B), como vimos na primeira figura, e o fator de ajustamento seria igual a 1, fazendo com que P(A|B) =P(A).
Mas se o evento B influencia A, saber que um evento ocorreu deve trazer evidências adicionais aos cálculos e o o teorema de Bayes pode ajustar a probabilidade base usando essas novas informações.
Como conhecemos o P(B|A) e P(A), a única probabilidade a ser determinada é P(B). Essa última, inclui o caso em que a testemunha disse que o táxi é Azul e ele é realmente Azul, assim como o caso em que a testemunha disse que o táxi é Azul, mas ele é, na verdade, Verde.
Podemos calcular essa probabilidade considerando dois eventos mutuamente exclusivos: o evento em que o táxi é Azul (A) e o evento em que o táxi é Verde (que vamos chamar de evento Ã) (no nosso caso, um táxi é Azul ou é Verde, não podendo ser ambos ao mesmo tempo).
Existem duas situações em que o evento B ocorre:
1. A testemunha identificar o táxi como azul e o táxi de fato ser azul (B∩A).
2. A testemunha identificar o táxi como azul e o táxi ser verde (B∩Ã).
B não existe se o táxi não for verde ou azul o que faz a probabilidade do evento B ocorrer ser a “soma” das áreas em cinza na imagem.
A probabilidade do primeiro caso ocorrer é a probabilidade de a testemunha dizer que o táxi é azul, dado que o táxi era azul, ou seja, 80%, multiplicado pela probabilidade de o táxi ser azul, ou seja, 15%.
Aqui a multiplicação da probabilidade condicional (P(B|A)) pela probabilidade de o carro ser Azul (P(B)) pondera a probabilidade. Por exemplo, se tivéssemos ainda mais carros Azuis, colocaríamos mais peso na condição em que a testemunha diz que o carro é Azul, dado que ele é Azul.
A probabilidade de a testemunha dizer que o táxi é Azul, dado que o táxi era Verde é equivalente a proporção de vezes que a testemunha falhou em identificar a cor do taxi, ou seja 20%. Multiplicando esse valor pela probabilidade de o táxi ser Verde, temos a área da segunda figura que representa a interseção dos eventos B e Ã.
Como A e à são mutuamente exclusivos, podemos somar as duas probabilidades calculadas anteriormente o que resulta na probabilidade da testemunha dizer que o carro é Azul (P(B)).
A probabilidade de o carro ser Azul, dado que a testemunha identificou o táxi como Azul é então:
Note que, sem a informação da testemunha, a chance de um táxi ser Azul seria 15%. A adição da evidência da testemunha aumenta as chances de o táxi ser Azul para 41%, mas ainda assim é muito menor do que os 80% que muitas pessoas dariam ao peso da evidência sem considerar a totalidade do problema.
Por que isso é importante? Porque uma probabilidade de 80% e uma probabilidade de 41% em um ambiente jurídico pode significar a diferença entre sentenciar ou não uma empresa ou até mesmo uma pessoa. E isso pode mudar o curso de vidas. E isso, sim, é importante.
CITAÇÃO DE HOJE
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